A Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça (STJ), órgão máximo do Tribunal, ao julgar os Embargos de Divergência em Recurso Especial nº 1.874.222/DF (EREsp 1874222/DF), decidiu flexibilizar a regra geral de impenhorabilidade das importâncias salariais, de modo que, para a quitação forçada da dívida, o devedor pode ter seu salário parcialmente bloqueado, independentemente do quanto receba.
Ao mitigar o princípio da impenhorabilidade salarial, o STJ relativiza a letra do art. 833, inciso IV c/c § 2º, do Código de Processo Civil (CPC), segundo o qual somente os proventos salariais excedentes a 50 (cinquenta) salários-mínimos mensais poderiam ser efetivamente penhorados para o pagamento de dívidas que não fossem referentes a pensões alimentícias.
Há alguns anos, determinadas turmas do STJ já vinham adotando esse entendimento, o qual, todavia, não era unânime dentro do Tribunal. Tal dissídio, nos últimos tempos, vinha gerando a prolação de decisões conflitantes advindas do próprio STJ, motivo pelo qual foram interpostos os referidos embargos de divergência perante a Corte Especial, responsável pela uniformização da jurisprudência do Tribunal.
A relativização da impenhorabilidade salarial, no entanto, não é absoluta, de tal forma que a constrição deve ser condicionada à frustração de outros métodos executivos e ao não comprometimento da subsistência digna do devedor e de sua família. A tese resulta, portanto, da ponderação dos princípios da menor onerosidade para o devedor e da efetividade da execução para o credor, ambos lastreados no princípio da dignidade da pessoa humana.
No caso em apreço, por exemplo, após a Quarta Turma do STJ ter sido intransigível quanto à flexibilização da regra geral da impenhorabilidade, a Corte Especial decidiu que, no caso concreto, revelava-se razoável a penhora de 30% do salário mensal do devedor, da ordem de R$ 8.500,00, para o pagamento da dívida de aproximadamente R$ 110.000,00.
Com esse julgamento, tal entendimento prevalecerá não somente no STJ, mas também nos tribunais de instância inferior, os quais, independentemente da natureza da dívida a ser paga, deverão permitir, conforme as circunstâncias do caso concreto, a penhora parcial do salário do devedor, caso inexista outra medida executiva hábil a satisfazer a execução.
Por isso, é importante que o devedor se atente às obrigações assumidas e às cobranças feitas pelos credores, pois, em caso de ação judicial, caberá ao devedor demonstrar quanto da sua renda é comprometida com as despesas básicas para sua subsistência e de sua família, como alimentação, saúde, educação, segurança, dentre outras típicas do seu dia a dia, sob pena de ter parte desse rendimento penhorado para o pagamento de dívidas de qualquer natureza.
Fonte: STJ, Embargos de Divergência no Recurso Especial n.º 1.874.222/DF, Rel. Min. João Otávio de Noronha, Corte Especial, j. 19/04/2023